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Mensagem: O roubo do Rio Verde Grande Alberto Sena Pode alguém roubar um rio? Pode, sim. Claro que ninguém vai levar um rio para dentro de casa, mas se um megalomaníaco fizer um projeto de irrigação agrícola desproporcional à capacidade da vazão d’água; instalar 11 pivôs centrais de 500 metros de raio cada um e ligar os monstrengos simultaneamente, estes sugarão toda a água do rio ao ponto de secar o leito. Isto não configura roubo? Foi o que fez o empresário F. A. L., subsidiado pela Sudene, na década de 1980, com o Rio Verde Grande, afluente do Rio São Francisco, na região da Jaíba, no Norte de Minas. Acostumado a ver megaprojetos norte-americanos na Califórnia, onde os empresários agrícolas utilizam-se das águas das geleiras para alimentarem os pivôs centrais de grande porte, ele quis fazer o mesmo na Jaíba. O fiasco do projeto dele atesta que nem sempre o que é bom para os norte-americanos é bom para os brasileiros, muito menos norte-mineiros, às voltas com o crônico problema da seca e escassez de água quase todos os anos, como já acontece no período atual. Ademais, o Rio Verde Grande é considerado pelos entendidos do ramo ‘um rio velho’. E a calha dele vem desaparecendo por causa do assoreamento e da poluição que sofreu ao longo dos anos e ainda sofre. A tendência é um dia o rio desaparecer, se nada for feito para perenizá-lo. O empresário construiu silos, armazéns e a sede do projeto agrícola. Plantou muito algodão e feijão, culturas apropriadas para a região, mas antes construiu um canal de concreto levando boa parte da água do rio para a propriedade dele. Toda vez que ligava os pivôs centrais para irrigar o algodão e o feijão, os proprietários abaixo dele e os moradores ribeirinhos ficavam sem água. O máximo que se podia encontrar eram poças d’água esparsas onde pequenos peixes lutavam para sobreviver no meio da lama. Um fazendeiro situado próximo do projeto agrícola, um dos primeiros prejudicados pelo empresário, foi quem fez a denúncia ao jornal e colocou até avião à disposição para levar os repórteres à Jaíba. A oferta não foi aceita e juntamente com o fotógrafo Eugênio Paccelli fomos à Jaíba no carro de reportagem. A viagem foi inesquecível. Jaíba era um lugar considerado tão distante naquela época e muito mais antes, quando tinha a fama de ‘refúgio de pistoleiro’. Diziam ainda na década de 1960 que pistoleiros praticavam crimes em Montes Claros e região e se refugiavam na Jaíba, ‘onde ninguém nem a polícia ousam ir prendê-los’. Jaíba tornou-se famosa, também, por causa dos frequentes casos de conflitos entre posseiros e proprietários de terras. O mais famoso foi o caso do posseiro Saluzinho, que desafiou a cúpula da Secretaria de Segurança de Minas escondido dentro de uma caverna onde resistiu até mesmo às bombas de gás lacrimogêneo. Guardamos com carinho uma das cenas mais lindas vistas naquela viagem: uma poça d’água no meio da estrada vicinal, verdadeiro tapete coberto de borboletas. Era tanta borboleta que parecia não haver mais espaço para nenhuma retardatária pousar. Paramos o carro para contemplar o espetáculo multicolorido que só o sertão da Jaíba pode proporcionar. Na ocasião, trabalhávamos para a Editoria de Agropecuária do jornal Estado de Minas, onde introduzimos a cobertura jornalística de meio ambiente. O editor era o jornalista Mauro Werkema. Ele deu o seguinte título à primeira reportagem sobre o caso, de repercussão nacional (valeu inclusive o ‘Prêmio Fenaj de Jornalismo’ e foi publicada no livro ‘Cadernos de Jornalismo I’, da Federação Nacional dos Jornalistas - Fenaj): ‘O roubo do Rio Verde Grande revolta a Jaíba’. A matéria ocupou uma página. Na mesma manhã em que circulou a edição, por meio de um telefonema veio a notícia: ‘As águas do Rio Verde Grande voltaram a correr’. O empresário não gostou da publicação. Tentou se explicar querendo dividir a culpa por ter secado o rio. De fato, ele não era o único irrigante, mas o maior. E põe maior nisto. Numa tarde o telefone tocou na Editoria de Agropecuária e era Mário. Dizia: ‘Falo em nome do empresário F. A. L., ele quer saber se estão precisando de alguma coisa’. ‘Não precisamos de nada’, e acrescentamos: ‘Admiramos, Mário, você se prestar a isto’. Ele respondeu: ‘Me desculpe, não está mais aqui quem lhe falou’. E desligou o telefone.
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