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Mensagem: Mozart David e suas obras José Prates Ontem, remexendo a gaveta de minha mesa de trabalho, a procura de um papel, por acaso, encontrei um marcador de página com a fotografia do Sr. Mozart David que deve ter vindo no livro de sua biografia que me foi enviado por Julizart, seu filho, meu amigo de infância e companheiro nos folguedos próprios daquela nossa idade. “Seu” Mozart, como nós o chamávamos, durante anos e anos foi o Prefeito de Jacaraci, pequena cidade do sertão baiano que me viu nascer e onde vivi parte de minha infância. A bandeja das recordações foi aberta pela foto, fazendo ressurgir na mente, minha vida de criança pobre naquele lugar pequeno, cuja população da época, não sei quantos habitantes, parecia mais uma grande família. Pobres e ricos havia, como havia e há em todos os lugares do mundo, mas, em Jacaraci, pelo menos naquela época, existia união entre as duas classes, uma união sadia que permitia uma convivência tranqüila. A Prefeitura, sob o comando de “Seu” Mozart, ajudava na medida em que lhe era possível, socorrer os pobres com empregos na municipalidade que, mesmo com pequeno salário, tornava-lhes possível a manutenção. Não havia uma grande separação distanciando uma classe da outra, tanto que no “areião” da Rua do Fogo ou na Praça da Igreja, com a meninada brincando, não se podia distinguir o rico do pobre porque: a alegria era uma só. Parodiando a moçada de hoje, digo que “Seu” Mozart era meu ídolo. Naquele tempo, como estava aprendendo telegrafia com meu Padrinho que era o Agente Postal Telegráfico, eu fazia, também, o trabalho do carteiro que não existia na cidade e o comércio me pagava pra isso, trinta mil reis por mês. Quando eu ia entregar a correspondência de “Seu” Mozart, ele sempre estava à máquina de escrever, parece-me que era a única do lugar. Eu ali ficava parado, contemplando aquele homem de olhos fixos no teclado e atenção única para o que escrevia. Eu esperava paciente, calado, pra não atrapalhar. Sei que ele não havia cursado faculdade e creio não ter feito nem o ginasial, mas, era um mestre em português, excelente escritor. Autodidata, talvez tenha recebido auxílio da esposa Dona Julieta, professora formada, excelente mestra, responsável pela formação intelectual dos jovens, seus alunos nas Escolas Reunidas de Jacaraci. Alguns deles sobressaíram-se nas letras como, por exemplo, Dalcy Guimarães, autor de alguns livros. Os discursos de “Seu” Mozart eram peças literárias, com alguns publicados em jornais de Salvador. Alem de literato, era, também, um bom artista plástico e pode-se dizer que amava a arte, porque qualquer oportunidade que se lhe apresentasse, lá estava ele como artista, de pincel na mão. No teatro municipal, ele sozinho, decorou toda sala de espetáculo com pinturas mostrando artistas em apresentações. Na fachada do prédio, encimando a pratibanda, a estatueta de um menino com os braços abertos num convite ao espetáculo, mostrava ou ainda mostra a arte de “seu” Mozart. De vez em quando, me vêm à lembrança os anos de minha infância na cidadezinha de Jacaraci e nessas lembranças está presente “Seu” Mozart que faz parte da ala dos grandes vultos que guardo na memória, cujos exemplos ajudaram na construção do homem que me tornei. . A cidade de Jacaraci era pequena, tinha pouca opção de lazer. Alem dos bailes que, de vez em quando, aconteciam no salão da Prefeitura, ou alguma peça levada ao palco do pequeno teatro pelos jovens interessados em dramaturgia ou algum circo que aparecia de vez em quando, armando a lona no Largo da Feira, nada mais acontecia. “Seu” Mozart, então, sempre preocupado com seu povo, procurava por todos os meios, trazer para a cidade alguma inovação que servisse de lazer para os habitantes. Dentro desse espírito inovador, a grande novidade foi o banheiro público. Ele traçou os planos e orientou a construção. Ficava ao fundo do Parque Municipal, recém criado, um grande espaço de lazer, com trapézios, gangorras, pista de corrida, etc. Foi a primeira vez que o cimento chegou à cidade. Aproveitando uma pequena queda d’água, fez-se uma represa com uma profundidade mais ou menos de um metro e meio, uma espécie de piscina, toda cercada por muro alto, permitindo privacidade aos banhistas. Uma placa indicava se ocupado ou livre. O banho coletivo tinha a meninada toda, completamente nua, era uma farra que se repetia todas as tardes. Á noite, à luz da lua, as moças se juntavam para o banho coletivo. “Seu” Mozart foi embora, mas, a sua obra e a sua lembrança nunca desapareceram da alma de Jacaraci, como nunca desaparecerão as lembranças que guardo da minha infância inocente e tranqüila vivida na Jacaraci menina, no sofrido sertão baiano, que muito contribuiu na construção do alicerce de minha vida. (José Prates, 84 anos, é jornalista e Oficial da Marinha Mercante. Como tal percorreu os cinco continentes em 20 anos embarcado. Residiu em Montes Claros, de 1945 a 1958, quando foi removido para o Rio de Janeiro, onde reside com a familia. É funcionário ativo da Vale do Rio Doce, estando atualmente cedido ao Sindicato dos Oficiais da Marinha Mercante, onde é um dos diretores)
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