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montesclaros.com - Ano 25 - domingo, 17 de novembro de 2024
 

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Mensagem: VADE RETRO Aracy teve uma vida difícil. Nasceu numa família pobre, pai alcoólatra, mãe caixa de supermercado, foi aluna de escola pública suburbana e a única filha no meio de quatro irmãos, marmanjos que viviam à toa. A dura realidade a fez perceber que sonhos de bela adormecida e príncipes encantados não se realizariam. Entendeu, menina, que só o estudo lhe daria a chance de sair daquele fado de pobreza. Após a escola, empacotava feiras no caixa da mãe, dando a ela as gorjetas recebidas para ajudar nas despesas da casa. Dedicava o tempo que sobrava às tarefas escolares e à leitura. O empenho nos estudos a fez arranjar emprego de escriturária numa contabilidade do subúrbio. Ralava seis dias por semana, fazia horas extras e nunca tirava férias. Num dos serões, casta, caiu na lábia de um habitual galanteador, com promessas de casamento e vidinha do lar e acabou buchuda. Mãe solteira. Desabaram as quimeras e ilusões. Aracy isolou-se, pactuou-se com a amargura. Sua vida restringiu-se a educação de Esperança, sua filha. Ela, sim, teria uma vida de sucesso, seria bem casada, lhe daria netos e orgulho. Criou a miúda com toda proteção e nos melhores colégios possíveis, sempre a alertando sobre as maldades do mundo e a lábia dos garanhões indolentes. Nada de namoro, festinhas e más companhias. A cada amizade que Esperança iniciava, era logo sabatinada sobre a origem e as intenções do pretendente. Afora o seu diuturno trabalho contábil e a sua fiscalização a rédeas curtas da vida da filha, Aracy se dedicava orgulhosa ao seu curso de advocacia por correspondência e ao estudo do latim. No seu cotidiano, utilizava de frases latinizadas para alimentar seu ego e impressionar seus compartes contadores. Até mesmo em casa abusava da língua mãe para falar com a sua filha. Se a menina se preparava para sair, ela logo questionava: - ´Quo vadis´, Esperança? - Mãe, vou encontrar com uns colegas de escola. - ´Nota bene´, o ´status quo´ não está mole, evite ´persona non grata´. Se eu te pegar ´in flagrante delicto´, você vai ter comigo. Ninguém vai abusar da minha filha. Você veio ao mundo para bradar: ´Veni, vidi, vici!´. Lembre-se, sempre: É ´sine qua non´ permanecer pura até o casamento! Os anos passaram, Esperança, mesmo sobre vigília intensa, namorou, noivou e casou. Na despedida para a lua de mel, ouviu de Aracy: - Cuidado, todo o cuidado quando estiver ´in natura´ com ele. Se dê ao respeito. Olha o ´modus operandi´ que te ensinei. A viagem de núpcias ocorreu sob uma expectativa imensa. Aracy nunca tinha ficado tanto tempo longe da filha e fez de tudo para não ligar e escarafunchar detalhes. Na volta da sua cria, inquiriu sobre toda a viagem de núpcias, até que fez a sua derradeira pergunta: - E aí, minha filha, ´consummatum est´? Esperança assentiu com a cabeça, levantou as pálpebras, e confidenciou com os olhos bem abertos: - E ´oeste´, mamãe.

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