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montesclaros.com - Ano 25 - sábado, 16 de novembro de 2024
 

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Mensagem: Emanuel segue Ruggero Manoel Hygino A mensagem chegou do escritor Fábio de Sousa Coutinho, presidente da Associação Nacional de Escritores, informando que, na noite do dia 29, falecera Emanuel Medeiros Vieira, de que publicara aqui trechos de comentários. Nascido em Santa Catarina, andou pelo mundo, escreveu, foi preso, assumiu um câncer que lhe devorou o resto da resistência. O velório e o sepultamento foram no Campo da Esperança, no dia seguinte em Brasília. Transcrevo parte de um depoimento seu: “Lembro-me do padre jesuíta italiano Ruggero – tão alto – a gente varando noites, conversando sobre Teilhard de Chardin (1881-1955), Soren Kierkegaard (1813-1855), existencialistas cristãos como Gabriel Marcel (1889-1973) – que rejeitava o termo “existencialismo” –, Emmanuel Mounier (1905-1950) – fundador da revista “Esprit” –, agnósticos e ateus, como Albert Camus (1913-1960), Jean Paul Sartre (1905-1980), e marxistas como Maurice Merleau-Ponty (1908-1961). No final – sempre no final – ele arrematava: – Nunca te esqueças da Misericórdia Divina. (Ele era sempre profundo, mas – nesta frase – queria ser abertamente “solar”.) MISERICÓRDIA DIVINA. Ele acreditava que eu era possuidor de uma “fé forte e cósmica”, mas que o tempo, as leituras e as dúvidas me afastaram dela. – Quero te dar mais ÂNIMO, e falava mais alto e soletrava a palavra “ÂNIMO”. Ria, me abraçava. Ruggero era muito culto, leitor voraz, mas sua sabedoria maior era a simplicidade. Tomávamos vinho, assistimos juntos duas vezes a “O Sétimo Selo”, 1957, (“Det sjunde inseglete”); ”Morangos Silvestres” (Smultronstället”), 1957, de Ingmar Bergman (1918-2007). Também vimos várias vezes “Rastros de Ódio” (“The Searchers”), 1956, de outro grande mestre: John Ford (1894-1973). Gostávamos muito também de Orson Welles (1915-1985) e assistimos algumas vezes a “A Marca da Maldade” (“Te Touch of Evil”), 1958, que admirávamos muito, até mais que “Cidadão Kane” (“Citizen Kane”) 1941 – por muitos considerado o melhor filme de todos os tempos. Um dia, ele morreu. Tinha um carinho enorme pelos “humilhados e ofendidos da terra”, como dizia, pelos pobrezinhos, pelos sem nada. Modesto, batina puída, evangelizava operários em comunidades pobres de Porto Alegre e pescadores em Florianópolis – não era amado pelos hierarcas, poderosos e conservadores da Igreja– afora a burguesia da capital gaúcha e da Ilha do meu nascimento. E um dia– parece incrível – fui eu a consolá-lo. Triste, ferido com injustiças e perseguições (que não relato aqui), aquele sacerdote loiro (parecendo um camponês do interior de Santa Catarina), de quase dois metros, desajeitado, possuidor de um coração maior que ele, morando em uma casinha simples de madeira, num bairro humilde de Porto Alegre (antes estivera durante dois anos em Ponta das Canas, em Florianópolis, praia bela do Norte da Ilha de Santa Catarina, minha terra natal – ainda aprazível, pregando para os pescadores, dando para os pobres até a roupa do corpo, dividindo tudo o que tinha. Sempre achei que ele nascera na época errada. Deveria ter vivido na época das Catacumbas, levando a palavra de um Jesus pobre e libertador contra o Império Romano. Escrevi acima: Um dia, ele morreu. Qual a causa (indagam)? Foi “pelo coração” – ataque cardíaco. Mas acho que morreu de tudo, de tudo um pouco, devido às perseguições sofridas, às injustiças que percebia no tão imperfeito mundo, à inveja de que foi vítima, difamado por tantos seres medíocres e mesquinhos. Havia abandonado a batina, voltou para a Itália, mas retornou ao Brasil para se despedir. Então, já era um velho, cabelos brancos, parecendo mais baixo, o olhar azul mais triste. – “Desta vez, fui eu quem perdi a Fé”, me confessou. Tentei animá-lo, não falando em igreja, “reconversão”, nada. Mas nos filmes que havíamos assistido juntos. – Não há nada depois daqui, ele disse.

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