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montesclaros.com - Ano 25 - sábado, 16 de novembro de 2024
 

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Mensagem: MACHO MAN No verão de 94, Marão aporrinhou o seu compadre João Valle Maurício a largar Monsclaro e viajar pelo mundo. - Deixa de ser munheca, João! Vamos viajar! Adular as patroas! Você fica guardando dinheiro para genro gastar. E olha que os seus são mais ricos que você. - Mário, eu é que sei dos meus apertos. - Bobagem, vende o Fronteiro, cala os apertos e vamos queimar dinheiro. Jacy e as meninas programaram uma viagem pros States e Caribe. Leva a Milene e as filhas e faça uma média boa. Serão elas que vão tolerar suas rabugices e imundices na velhice. Dito e feito. Um mês depois, fomos todos para Miami e em seguida para um cruzeiro no Caribe. Naviozão colosso, dez andares de altura, mais de 2500 passageiros, muita festa e comilança. Na primeira manhã, fomos juntos para o deck da piscina apreciar aquela confraternização toda. Maurício, Milene, Marão, Jacy e as filhas aninharam-se em cadeiras ao redor da piscina, tomando margaritas e burritos. Eu, inquieto, fiquei a circular, observando aquele burburinho agitado ao som de rumba e salsa. Nisto um apresentador poliglota, metido a galã, de microfone em punho, que circulava e animava o ambiente, me segurou pelo braço e disse: - Here one more for the contest “Macho Man” (Eis aqui mais um para o concurso do “Macho Man”). Eu, sem entender direito, refuguei dizendo: - O quê? O homem, então, emendou: - Ah, brasileiro? De onde? Está gostando da viagem? Eu só dizia: - Não! Não! Não! Eu não quero participar do concurso. Aí, o fiduma, sem me largar e de posse de seu potente alto-falante, perguntava a todos os passageiros do navio na mais diferentes línguas: - He will participate in the contest Macho Man or not? Él participará en el concurso “Macho Man” o no? Ele vai participar do concurso “Macho Man” ou não? A cada pergunta do apresentador, centenas de pessoas espalhadas pela piscina e pelas sacadas dos andares respondiam: - Yes! Oui! Si! Sim! Não teve jeito. Esperneei, fiz de tudo, mas não consegui escapulir daquele mico. O navio chamava-se “Celebrity” e eles queriam escolher já no primeiro dia a celebridade: o Macho Man. Foram selecionados mais três concorrentes e fomos colocados cada um num dos quatro cantos da piscina, em cima de palcos em forma de cilindros parecidos com aqueles das chacretes. Eu, naquela semgraceza toda, torcia para acabar tudo rapidinho e o mico ser o menor possível. A primeira tarefa foi nos colocar para imitar o Mister Universo exibindo os músculos, como num concurso de fisiculturismo. Como não tenho e nem tinha músculos para mostrar, resolvi levar na gozação e estufei a minha barriga desenvergonhadamente. Uns riram, outros vaiaram. Um vexame. Daí, o agitador informou a segunda tarefa: - Macho que é macho grita que nem Tarzã. Vamos ver quem grita melhor e mais alto. Eu então pensei com os meus botões, bom, isso é fácil, quantas vezes não imitei o Johnny Weissmuller na minha infância? Os outros concorrentes berraram uns gritos mixurucas mais sem graças e eu me animei. Quando o apresentador colocou o microfone na minha frente eu enchi o peito de ar, abri a boca e soltei com toda força do mundo um grito horrível: pífio, agudo e estridente. Como imitar Tarzã com a boca totalmente aberta? Fiasco total com vaias unânime. Outro vexame. Fui para a terceira tarefa, desmoralizado e envergonhado. Eles colocaram uma linda mulher, balzaquiana, sentada sublimemente num pedestal, como uma deusa, e tínhamos que galanteá-la com gestos, palavras e cantos, a la Don Juan. Pensei, tô lascado. Lá vem mais uma vaia. Olhei para os lados e vi Tio Maurício. Abri os braços com as palmas das mãos abertas mostrando o meu desespero e, ele, montesclarense até a alma, invejando o meu lugar, deu a solução: - Cante “Amo-te Muito”! Cante “Amo te Muito”! Seria a perfeição, cantar o nosso hino de amor para um navio entulhado de gringos de todas as nacionalidades. Sem dúvida, sucesso garantido. Só tinha um probleminha: não sei cantar nem sabia a letra de “Amo-te Muito”. Aí, foi o vexame dos vexames. Meu galanteio restringiu a um cumprimento a uma suposta alteza, referenciando-a com um suave movimento de braço e um beija-mão ridículo. Tio João olhou para mim, balançando a cabeça com o desdém a um verme. Hoje, fico a pensar, que deveria tê-lo chamado para cantar em dupla. Ele soltaria orgulhosamente a voz e eu o dublaria mudamente. Tio Maurício ficaria todo orgulhoso e eu me safaria do vexame. Enfim, a quarta e última tarefa: cada um dos quatro concorrentes deveria chamar o maior número de mulheres para o seu canto da piscina. Não foi tão difícil assim, pois logo localizei minhas irmãs, minha mãe, dona Milene, Vitória e Liliane, e elas me ajudaram a arrebanhar mais gente. Mas, em seguida, o apresentador arrematou: - A pontuação será dada em dobro a quem convencer às mulheres a pularem na piscina e, em triplo, se caírem de roupa. Antes de ele terminar de dar as explicações, Mamãe deu um tibum dentro d’água, de roupa e tudo, para me dar a pontuação máxima. Mônica, Bertha e as Maurício vieram atrás imitando-a. Percebi num relance que naquele deck havia um imenso e repleto toalheiro com rodinhas e eu o puxei para perto da escada da piscina, onde à medida que cada mulher saía da agua eu beijava sua mão, agradecia e lhe dava uma toalha. O navio inteiro foi um aplauso só. Não teve apuração, todo mundo começou a gritar: - Macho Man! Macho Man! Macho Man! Ganhei brindes, perfumes e uma camiseta com os dizeres: “Sou uma Celebridade. Sou o Macho Man.” Nunca fui tão famoso. Por onde passava alguém me saudava: - Hi, Macho! - Olá Macho! Uns 3 dias depois, de manhãzinha, ainda no mandato de Macho Man, o navio aportou no México. Tio João me chamou reservadamente e fez um ultimato: - Ucho, nós vamos descer do navio e não vai ficar uma bodega desta Acapulco em que nós não vamos tomar um trago, uma tequila. Combinado? Eu, sem vacilar, respondi: - Combinado! Saímos os dois, alegres e joviais, com o México sob os nossos pés. Tio Maurício impecável. Calça vincada branca, blazer azul marinho, botões dourados, lenço vermelho no bolso da frente, sapatinho duas cores e um quepe de almirante estalando de novo. Pronto para o que desse e viesse. Eu de jeans e vestido com minha célebre camiseta de Macho Man. O dia estava reluzente, céu e mar azuis de tinir, temperatura agradável, brisa boa e nossa disposição para virar o universo ao avesso. Na saída do navio abracei Tio João e ele foi desembrulhando conselhos como caramelos: - Ucho, a vida é pra ser vivida mais açoitadamente. Não podemos debrear. Lembre-se, sempre um uísque a mais, um sono a menos, um calor, uma paixão. Temos que aquecer o coração. Devemos nos entregar aos sonhos. Hoje é um dia que vamos nos presentear. Nós merecemos. Dito e feito. Entramos em todos os bares que vimos pela frente. Pedíamos a tequila no balcão. Tio João puxou conversa com todo mundo, chicos e chicas, cantou, dançou, recitou, fumou charuto, flertou com raparigas, aprendeu o grito del mariachi, ensinou-me “Amo-te Muito”, tomou mezcais e mojitos, provou todos os antojos e petiscos e encheu os meus e os seus olhos de alegres lágrimas. Fomos completos e plenos durante o dia inteirinho, transbordamos contentamento e irmandade. No entardecer, já atrasados para o embarque, voltamos cantando “Rapariga do Bonfim”, “Amo-te Muito” e gritando repetidamente: - “Viva o Mé-rri-co”. No pau que a gente estava, nem notamos que os passageiros do navio estranharam aquela cumplicidade amiga e carinhosa do Macho Man com aquele elegante, singelo e rico senhor. Eram só cochichos e olhares maldosos... Nós dois, amparados um no outro, entrelaçados, rodopiamos pelo navio até alcançar as poltronas reclináveis da piscina. Pedimos mais duas saideiras tequilas Jose Cuervo e antes de sermos servidos nos apagamos nas espreguiçadeiras. Nirvanamente mortos. Só abri os olhos um par de horas depois, devido ao estalar dos flashes das máquinas fotográficas de uma porção de idiotas. Percebi, com pena, o preconceito deles ao ver o Macho Man do navio dormir de mãos dadas com o galante e idoso senhor. Nem dei bolas, fechei os olhos em desprezo, certo e alegre de ter passado um dia maravilhoso com o supimpa Tio João Valle Maurício. Não larguei sua mão e continuo enlaçado aos seus sábios conselhos.

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